domingo, 23 de outubro de 2005

CAROLINA MARIA DE JESUS

“Vou colocar vocês em meu livro!” – disse uma senhora negra, favelada, ao ver uns bêbados destruindo o parquinho das crianças na favela Canindé. Essa era a sua arma: o poder da escrita. Carolina Maria de Jesus, a catadora de papel que atingiu o sucesso meteórico com o livro Quarto de Despejo, registrou o sofrimento e a luta por dignidade de uma mulher negra, mãe solteira e favelada. “Parece que quando eu nasci o destino me marcou para passar fome”. Era a chamada “amarela”, pois assim o mundo lhe parecia no agudo desse sofrimento.

O sucesso do Quarto de Despejo ocultou o restante da sua obra, de enorme valor literário, composta por poemas, crônicas, contos e até peças de teatro. Deixou ainda dois discos e especiais na TV Alemã e na Rede Globo. Sucesso, a bem da verdade, totalmente superficial pois no dia mesmo do lançamento do Quarto de Despejo ela ainda saiu para catar papel.

Passado a euforia do desenvolvimentismo dos anos JK, Carolina Maria de Jesus retornou à sua vida de favelada contestando uma sociedade hipócrita que pregava a igualdade de oportunidades para todos. Nem os movimentos negros e feministas da época fizeram dela um emblema das suas lutas. Julgavam-na “inadequada” para tal, ou noutras palavras, expunha demais as contradições daquela sociedade. O Projeto Nosso Samba, herdeiro legítimo das lutas sociais do povo negro, quer honrar a memória dessa guerreira. Salve Carolina Maria de Jesus.

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